PostHeaderIcon ÁLVARO CUNHAL E A GREVE COMO FORMA SUPERIOR DA LUTA DE MASSAS

ÁLVARO CUNHAL E A GREVE COMO FORMA SUPERIOR DA LUTA DE MASSAS

Ao longo da sua vida de dirigente comunista, Álvaro Cunhal deu uma permanente atenção à luta de massas, como forma principal de luta do povo e dos trabalhadores, em particular às greves económicas, reivindicativas e políticas, como forma superior dessa luta.

Na sua obra escrita, quando analisa etapas cruciais da luta anti-fascista, da revolução de Abril, e da posterior resistência contra a recuperação capitalista e na defesa de direitos e conquistas, quando propõe novos avanços na acção e organização dos comunistas, dos trabalhadores e do povo, lá encontramos, a análise dos impactos políticos da luta de massas, com relevo para as greves, os seus objectivos e razões, a sua direcção e organização, os seus resultados, as vitórias e derrotas, do que foi bem feito, e os erros cometidos.

É por isso que ainda hoje, na segunda década do século XXI, comunistas e activistas do movimento sindical de classe, podem aprender muito com a visita aos textos em que Álvaro Cunhal fala das lutas e da organização da classe operária.

 

É por isso que a homenagem do movimento sindical e dos activistas sindicais ao grande revolucionário na passagem do centésimo aniversário do seu nascimento, não só é justificada, mas mais do que isso, é um dever de todos os que se dedicam honestamente e sem preconceitos à causa dos trabalhadores.

Em plena II Grande Guerra Mundial, quando da onda de greves por aumentos salariais e contra o aumento da jornada de trabalho, na região de Lisboa, em Outubro/Novembro de 1942, cujo espoletar fora o exemplo não esquecido ao longo do ano, da greve de 5 de Novembro de 1941, na Covilhã, pelos mesmos motivos, Álvaro Cunhal, após a verificação de que em muitos casos o movimento se iniciara espontaneamente e que isso se devera a deficiências do trabalho de organização e direcção, aponta medidas de correcção organizativas que na sua concepção, apontam de forma clara, aos comunistas, o que deve ser o trabalho unitário. «Criação, desde já, duma direcção para o movimento em cada local de trabalho, direcção essa composta pelos trabalhadores mais honestos e decididos à luta. Estando nós, comunistas, dispostos a colaborar com todos os que estejam nestas condições, quaisquer que sejam os seus ideais políticos ou crenças religiosas.»[1]

Mas onde Álvaro Cunhal demonstra saber tão bem como qualquer bom dirigente sindical como se organiza e dirige uma greve, é em dois artigos que publica no Militante de Setembro e Outubro de 1947, sob os títulos, «Alguns Problemas de orientação na greve de Lisboa»[2] e «Alguns problemas de organização na Greve de Lisboa.»[3] Depois de valorizar a vitória que constituiu a greve de Abril para os operários de Lisboa, a correcção da luta no plano legal, com destaque para a forma democrática da escolha das comissões de empresa e da Comissão Geral, com delegados das várias empresas, a acção e a ligação diária de todas estas comissões com os trabalhadores, prestando-lhes contas e solicitando-lhes o apoio, as grandes concentrações e assembleias nas empresas, Álvaro Cunhal questiona aspectos menos positivos na direcção e organização da luta e retira deles os devidos ensinamentos.

Sobre a direcção da greve, crítica o facto de os quadros terem ficado agarrados à forma de luta de “greve de braços caídos” por pequenos períodos de 15, 20 minutos, nos locais de trabalho, preconizando-a também para uma greve de maior duração, o que teve a justa resistência dos trabalhadores, pois isso significava ficarem na empresa à espera da inevitável acção brutal das forças fascistas. No caso, para uma greve mais longa a ausência ao trabalho era a forma de luta mais adequada.

Tece considerações notáveis sobre o momento certo para naquela conjuntura se chamar os trabalhadores à greve, e critica o facto de se ter apelado à greve de 24 horas para toda a região de Lisboa, o que era pouco para os operários da construção naval, onde já se sabia que os trabalhadores iriam fazer greve por mais tempo, e era muito para os restantes trabalhadores, onde o apelo «devia dar margem a várias formas de solidariedade e luta, com subscrições, protestos, pequenas suspensões de trabalho e (onde houvesse condições) greves até 24 horas.»[4]

Na continuação do seu exercício de autocrítica enquanto dirigente do PCP e de crítica aos organismos do Partido que acompanharam a greve, Álvaro Cunhal detectou falta de audácia quando o partido não acompanhou de início o movimento dos trabalhadores, ficando para trás em vez de estar à frente, e depois, de não ter sabido determinar o momento certo para o recuo, quando a greve se começou a esvair e muitos trabalhadores começaram a regressar ao trabalho.

A concluir as suas considerações sobre os erros de direcção cometidos durante a greve, afirma o que ainda hoje continua a ser válido para qualquer luta de massas. A ligação às massas tem de ser capaz de conhecer, em cada momento, a sua verdadeira disposição e as suas aspirações «de forma a nunca irmos demasiado atrás nem demasiado à frente das massas.»

Sobre a organização da greve, começa por afirmar que a falta de organização leva à quebra da unidade e abre passo à vitória do inimigo, e de seguida desenvolve a concepção de que os organismos de direcção da luta não podem ter sempre as mesmas características. E para demonstrar a tese, aponta o facto de as comissões de unidade e as comissões gerais de delegados eleitos pelos trabalhadores terem sido os organismos adequados para dirigir a luta enquanto ela se desenrolou dentro da legalidade fascista, mas aponta como um erro a sua continuidade na direcção da luta quando esta passou a ser a greve, ilegal no quadro da Ditadura, porque nesta situação ficaram completamente expostas à repressão fascistas. E conclui, que a organização adequada nesta situação teria sido a constituição de comités de greve mais leves e flexíveis, formados por trabalhadores que não pertencessem às comissões de unidade.

As acções e formas de organização rotineiras e mecanicistas, a falta de atenção permanente ao sentir e às aspirações dos trabalhadores, são aqui fortemente zurzidas por Álvaro Cunhal, ao mesmo tempo que enfatiza a necessidade de os quadros adaptarem constantemente as palavras de ordem a cada situação concreta, determinarem em cada momento o sentido correcto de orientação da luta, de serem audaciosos no momento de avançarem ou recuarem.

Aprender com os erros cometidos para em seguida se fazer melhor é a grande lição destes ensinamentos do grande revolucionário.

 


[1] ÁLVARO CUNHAL – Obras Escolhidas Vol. I (1935-1947) Edições Avante! Lisboa, 2007 p. 162

[2] Idem p.728

[3] Idem p. 735

[4] Idem p. 731

Actualizado em (Terça, 07 Maio 2013 00:12)